Minha experiência no Toastmasters

Ernée Kozyreff Filho • 30/nov/2024

Logomarca do Toastmasters e comemoração de seus 100 anos.

Toastmasters International é uma organização sem fins lucrativos cujo objetivo principal é desenvolver nas pessoas a habilidade de falar em público. Foi fundada em 1924 e completou no mês passado 100 anos (!). Atualmente está presente em 150 países e possui mais de 270 mil membros. Eu participei do Toastmasters de forma muito ativa entre 2012 e 2014 e, neste texto, falo sobre essa experiência e como tudo funciona.

A primeira reunião

Conheci o Toastmasters enquanto morava nos EUA, mais especificamente em Lubbock, Texas. Os meus colegas de doutorado me convidaram para participar de uma reunião do clube da universidade, que ocorria todas as terças-feiras às 6h30 da manhã. Confesso que, devido ao horário, não aceitei o convite logo de primeira, mas depois de algum tempo resolvi conhecer.

Lembro que, quando saí de casa, ainda estava escuro. Cheguei ao local, entrei na sala e vi uma mesa lateral com café e algumas revistas, uma mesa central grande com cadeiras de ambos os lados, e na ponta um púlpito com uma bandeira trazendo a seguinte frase: “Toastmasters – Where Leaders Are Made” (em português, “Onde Líderes São Formados”).

Fui recebido pelos presentes e me sentei à mesa. Pontualmente às 6h30, um dos presentes iniciou a reunião de uma maneira um tanto formal. Disse algumas palavras e chamou um colega para dar seguimento. Este, por sua vez, fez sua parte e chamou outra pessoa. E assim a reunião seguiu até o seu fechamento, realizado pela mesma pessoa que fez a abertura.

Nesse primeiro dia, não entendi bem o fluxo das coisas e o que exatamente cada um estava fazendo, mas fiquei impressionado com a organização e o preparo de todos. Cada um sabia bem a sua função e, com isso, a reunião fluiu de maneira bastante suave. O tempo passou rápido e tive a sensação de que tinha participado de algo incomum.

Decidi me inscrever no clube ali mesmo.

Papéis e atividades nas reuniões

Depois de algumas semanas, passei a entender a sequência de eventos nas reuniões. Cada pessoa tem uma atividade previamente designada e deve chegar preparada para exercê-la. Essa atividade pode ser, por exemplo:

O início da reunião é feito pelo pelo presidente do clube, que dá as boas-vindas a todos e passa alguns recados. Em seguida é a vez do Toastmaster do dia, que é a pessoa que irá conduzir os discursos e comentários. A sua tarefa é apresentar os oradores e chamá-los até a frente da sala para fazer os seus discursos, sobre um tema de sua escolha.

Finalizado o último discurso do dia (normalmente são dois ou três), é iniciada a sessão de avaliações, e novamente o Toastmaster do dia chama outros membros do clube para dar feedback aos oradores sobre os discursos feitos. São considerados os mais diversos fatores relacionados à oratória, como estrutura da fala, tom de voz, linguagem corporal etc.

Na próxima parte da reunião, um dos membros traz um assunto de sua escolha e um conjunto de perguntas para fazer aos outros membros. Ninguém sabe qual pergunta irá receber nem em que momento será chamado. Para deixar a atividade mais interessante e desafiadora, as respostas devem ter pelo menos 1 minuto de duração. Mesmo que você não conheça o tema, sempre há algo a dizer, nem que seja o porquê de o assunto nunca ter lhe interessado. Esse momento da reunião é bastante divertido e também uma forma leve de se treinar falas de improviso, algo muito importante na comunicação cotidiana.

A última sessão é conduzida pelo avaliador geral, que comenta a reunião como um todo e faz considerações sobre o desempenho dos outros participantes. A reunião termina com o presidente, que faz um breve fechamento. Existem algumas outras atividades que deixei de fora para não alongar muito o texto, como votações para escolher os melhores do dia e correções de gramática e vícios de linguagem.

Participando de uma reunião do Toastmasters (2013). Fotos tiradas enquanto falamos costumam ficar estranhas. 😕

A metodologia

A principal característica da metodologia do Toastmasters é a de aprender fazendo. Em todas as reuniões, todos os membros participam ativamente, o que garante o aprendizado contínuo e a sensação de pertencimento. Ninguém é um mero ouvinte e muitas vezes até os convidados participam das atividades.

Outro fator importante é o material didático. Todas as práticas realizadas são descritas em manuais muito bem elaborados, com textos enxutos e informativos. Os manuais estão ligados a duas trilhas de aprendizagem: uma de oratória e outra de liderança. Cada manual costuma ter 10 atividades e, à medida que são completados, o membro recebe uma distinção (em inglês, um award) para simbolizar a sua conquista.

Para mim, essa forma estruturada de aprendizado é fundamental para diminuir a tensão de se falar em público, pois é possível se preparar para o momento em que estamos lá na frente. Além disso, as trilhas dão um norte de como está o progresso e quais são os próximos passos.

Um último ponto importante da metodologia é o clube ser um ambiente seguro para praticar, cometer erros e acertos. Todos estão ali por um propósito comum de desenvolvimento pessoal. As avaliações são feitas sempre com o intuito de trazer pontos de melhoria ao colega, num espírito de ajuda mútua. Tudo isso é fundamental para pessoas que se sentem muito inseguras na frente de uma plateia, já que o medo de falar em público é, muitas vezes, o medo de falhar em público.

Nota: na última década, o Toastmasters reformulou totalmente o seu material e as trilhas de aprendizagem foram atualizadas. A essência da metodologia, no entanto, permanece sendo o aprendizado prático e colaborativo.

Robert Barnhill

O clube que frequentei era especial por dois motivos. Primeiro, era o mais antigo da região, tendo sido fundado em 1951. E segundo, nós tínhamos o privilégio da presença de um membro ilustre, o Robert E. Barnhill III.

Bob, como era conhecido, tinha sido presidente global do Toastmasters em 1996-1997 e estava no clube havia 30 anos (!). A sua empolgação e dedicação eram contagiantes. Em suas apresentações, explorava a oratória em diversos aspectos, fazendo variações na voz (falando baixo, alto, mais rápido ou devagar), gesticulando, movendo-se pela sala, e às vezes até cantando. Toda fala, mesmo que curta, era uma aula de como falar em público.

Havia dias em que o número de pessoas na reunião era baixo e, por vezes, ninguém tinha sido escalado para fazer um discurso. E uma reunião sem discursos era incompleta, dava até uma sensação de vazio. Se o Bob estivesse presente, ele se voluntariava, dizendo “We always have a speaker” (“Nós sempre temos um orador”). E o discurso era sempre de altíssimo nível, mesmo que improvisado.

Outra frase que ele costumava falar era “Sing your song!” (“Cante a sua canção!”), querendo dizer que todos nós devemos expor as nossas ideias para o mundo. Quando você canta a sua canção, pode gerar em outras pessoas um efeito que nem imagina. Mas, se não cantá-la, ninguém irá saber.

O Bob faleceu em 2018, aos 61 anos, vítima de Esclerose Lateral Amiotrófica. Frequentou o Lubbock Club e cantou a sua canção até quando foi fisicamente possível. No vídeo abaixo, ele nos convida a participar do Toastmasters.

Bob Barnhill nos convidando para conhecer o Toastmasters.

Além do clube

Conforme o tempo passava, eu descobria mais camadas do Toastmasters. Conheci outros clubes na minha cidade (no total havia 12) e, em certo ponto, fui membro de quatro ao mesmo tempo. Os clubes eram agrupados em áreas (na minha cidade havia duas), as áreas são agrupadas em distritos, e estes são agrupados em regiões. Hoje existem 14 regiões espalhadas pelo mundo.

Além das reuniões semanais no clube, eventos maiores reuniam membros da mesma áreas e/ou do mesmo distrito, como conferências e campeonatos de oratória. Existe também uma conferência anual de toda a organização, com pessoas de todo o mundo. Nele, é realizada a última etapa do campeonato de oratória, com os finalistas que vencerem dentro de cada distrito. Eu estive presente na conferência de 2013 e assisti ao vivo o discurso vencedor do Presian Vasilev, dentre os outros finalistas. Até hoje, considero um dos melhores que já vi.

A criação do TOP (Treinamento Oratória Prática)

Terminei meus estudos nos EUA em 2014 e retornei ao Brasil. Vim com a ideia de continuar no Toastmasters e, quem sabe, até fundar um clube por aqui.

Cheguei a visitar o clube São Paulo Toastmasters e participei até de uma conferência nacional, mas devido a estar num novo trabalho que exigia bastante dedicação, acabei não frequentando as reuniões e também desisti da ideia de criar um novo clube.

Alguns anos depois, quando a vida profissional se estabilizou, decidi que era a hora de voltar com a ideia de fazer algo relacionado a oratória. Eu continuava com a vontade de dar chance para outras pessoas desenvolverem essa habilidade tão importante, assim como eu tinha feito.

Aproveitando-me da posição de professor universitário, criei uma disciplina optativa chamada “Práticas de Oratória”, que usava a metodologia do Toastmasters. Fizemos duas aulas presenciais e então chegou a pandemia de Covid-19, que nos obrigou a terminar o curso de forma remota.

Ainda assim, a disciplina foi um sucesso! Recebi um retorno extremamente positivo dos alunos, que chegaram a falar que gostariam que o semestre não acabasse. (Isso é algo muito raro! Normalmente eles não querem que o semestre nem comece. 🙂)

Decidi, então, levar esse curso para fora da universidade. Criei o material didático do zero, reformulei as atividades e mudei o seu nome para TOP – Treinamento Oratória Prática.

Somando-se todas as turmas, já passaram pelo curso mais de 80 alunos, dos quais recebi somente comentários favoráveis. Eu teria muito mais para falar sobre o TOP e como tem sido a experiência de ministrá-lo nesses anos, mas isso vai ficar para um outro artigo.

Desenvolver habilidades de oratória melhora não apenas a forma como nos comunicamos, mas também como nos conectamos com o mundo. Seja através do Toastmasters, com sua metodologia centenária, ou do TOP, pensado para uma experiência mais intensiva, o importante é dar o primeiro passo. Escolha seu caminho e comece a “cantar a sua canção”!

Primeira turma do TOP (2021).

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